O Brasil inteiro parou para assistir ao último capítulo da primeira versão de Vale Tudo, exibido em 6 de janeiro de 1989. O objetivo era descobrir quem havia matado Odete Roitman (Beatriz Segall).

O resultado gerou recorde de audiência para a Globo e críticas da parte de quem não gostou da escolha da assassina, incluindo o próprio dono do canal.

Mistério

O Natal de 1988 já tinha sido diferente: o público fez como Marco Aurélio (Reginaldo Faria) e deu uma banana para o Papai Noel. Em pleno dia 24 de dezembro, a Globo mostrou a simples cena onde se viu apenas um revólver disparando tiros. A partir daí, começava o mistério.

A emissora também faturou alto com a expectativa: além de ter fila para exibir comerciais no horário nobre, o Caldo Maggi, aquele da Galinha Azul, pagou 300 mil dólares para ter direito a fazer um concurso. Quem acertasse o autor dos disparos ganharia 5 milhões de cruzados. Foram recebidas 3 milhões de cartas de todo o Brasil. O mais cotado, com 24% dos votos, foi o mordomo Eugênio (Sérgio Mamberti).

Até o jogo do bicho faturou: de acordo com o jornal O Dia de 8 de janeiro de 1989, somente nas bancas do Rio de Janeiro foram arrecadados mais de 350 milhões de cruzados em apostas.

Finais alternativos

Cássia Kiss em Vale Tudo
Cássia Kiss em Vale Tudo

Para despistar a imprensa, mais fácil de controlar numa era que nem se sonhava com internet e redes sociais, a Globo distribuiu falsos scripts, que apontavam assassinos improváveis como Olavo (Paulo Reis) e, até mesmo, o garoto Bruno (Danton Mello). Além desses, teriam sido gravados finais com César (Carlos Alberto Riccelli) e Queiroz (Paulo Porto) como autores dos tiros.

Na hora da verdade, a escolhida foi Leila (Cássia Kiss), que matou Odete por engano, pensando se tratar de Maria de Fátima (Glória Pires), amante de seu marido, Marco Aurélio, a quem a empresária acusava de corrupto pouco antes de morrer.

As gravações foram realizadas com a presença de boa parte do elenco, que ficou sabendo a identidade da criminosa, na manhã do dia 6 – e era o dia do aniversário de Cássia, que só saiu de lá no final da tarde.

“Foi muita tensão. Ainda estou com dor de cabeça. O diretor, Ricardo Waddington, nos chamou e disse que tínhamos uma grande responsabilidade nas mãos. Acho que o final da novela me deu a oportunidade de mostrar o meu trabalho, pois, até então, eu havia servido apenas de apoio aos outros atores”, declarou a atriz ao jornal O Dia.

“Eu achei o desfecho fantástico. Leila era uma mulher comum demais, carente, com valores horrorosos, desequilibrada. Acredito que o fato dela ter sido escolhida como a assassina foi a melhor solução”, completou.

Nem todo mundo gostou

Evidentemente, nem todo mundo gostou do resultado. O próprio dono da Globo, Roberto Marinho (1904-2003), que era um ávido telespectador da novela, garantiu que não sabia quem havia matado Odete, mas, após a revelação, disse que a escolha foi muito óbvia.

“Com todo o sucesso da questão do assassino, acabamos por dar um mês de tranquilidade ao Sarney”, brincou Dennis Carvalho à revista Veja de 11 de janeiro de 1989, se referindo aos problemas políticos e econômicos enfrentados pelo então presidente José Sarney.

Somente no Rio e em São Paulo, cerca de 13 milhões de pessoas assistiram ao desfecho da trama. Por incrível que pareça, o penúltimo capítulo deu mais audiência que o último. Mas na hora da revelação do segredo, o índice no Rio era de 86 pontos para a Globo.

Para se ter uma ideia, Avenida Brasil, última novela a parar o Brasil em seu final, marcou 39 pontos de média, com 52 de pico, em 19 de outubro de 2012.